O
objetivo do blog Janela Interna é trazer temas relativos à psicologia numa
linguagem acessível, buscando difundir essa profissão e desconstruir alguns
mitos relativos à mesma. Acima de tudo, estamos aqui para falar sobre o ser
humano, sobre pessoas, e acreditamos que temas como arte, política, cotidiano e
cultura podem e devem estar presentes nos nossos textos.
Hoje
escolhi falar sobre o livro “O velho e o mar”, de Ernest Hemingway. Desde que
li venho querendo escrever alguma coisa, e acredito que esta é uma ótima
oportunidade de trazer o livro para o nosso contexto aqui. Meu objetivo não é
fazer uma resenha e nem uma crítica literária, apenas falar do meu ponto de
vista pessoal sobre o livro, e o modo como compreendi a mensagem que ele
transmite sobre o ser humano. Pra tal, obviamente recomendo que todos leiam o
livro, mas como imagino que a maioria não o fará, encontrei uma animação no
YouTube maravilhosa, em aquarela, que resume muito bem a história. O vídeo tem
duração de 20 minutos que valem muitíssimo a pena:
"O velho e o mar" possui apenas 126 páginas. É um livro bastante
fino, e não poderia ser diferente. Conta a história de um velho pescador, Santiago,
que se encontra em uma maré de azar, e não pesca nada há mais de 80 dias. O
garoto Manolim costumava acompanhar o velho em suas viagens, mas como este
acabou levando o título de “azarão”, os pais do garoto o proibiram de continuar
pescando com o velho, e o transferiram para um “barco de sorte”. Assim, o velho
sai para pescar sozinho, bastante otimista de que, desta vez, não voltará de
mãos vazias.
Em
seguida, o velho vai para alto-mar e, após algum tempo conseguindo pescar
apenas sardinhas, o que parece ser um peixe bem grande morde a isca. A partir
daí, o que temos são páginas e mais páginas descrevendo os pensamentos do velho
em relação a esse peixe, ao quão grande ele pode ser, qual o momento certo de
puxar ou dar mais linha, os movimentos que o peixe faz e o modo como o velho o
acompanha, além de algumas memórias e pensamentos pessoais, que vão, aos
poucos, contribuindo para a construção do personagem. Confesso que,
particularmente, achei bastante entediantes essas páginas que narravam os dias
(dois, se não me engano) que o velho passou no mar. O que não significa que não
gostei. Na verdade, o fato de ter achado a leitura enfadonha foi o que teve
para mim de mais belo na obra, e que se completa perfeitamente com o desfecho!
A
obra de Ernest Hemingway é muitíssimo influenciada pela sua própria vivência do
pós-guerra e, portanto, carregada de temas como o pessimismo e a solidão. A
experiência de ler “O velho e o mar” foi, para mim, como vivenciar a solidão de
Santiago. Ao longo da leitura, somos obrigados a encarar a nossa própria
solidão, a questionar o quão entediante pode ser estar a sós consigo mesmos, e
a conviver com esse incômodo durante toda a narrativa. Para além disso,
acompanhar todo o esforço de Santiago, sua entrega, o modo como respeita e
compreende o peixe, suas dificuldades, feridas, o sol, a fome e a sede, foi o
que, na minha opinião, torna o livro uma história sobre a vida.
[SPOILER
ALERT]
Ao
final, tem-se o que é, para mim, o desfecho decepcionante e, por este motivo,
perfeito: a experiência da frustração. Compreender que nem sempre o esforço
honesto e a dedicação são garantias de que vamos alcançar os resultados
desejados. Assim como é a vida. Santiago consegue pescar o peixe, porém não
consegue trazê-lo de volta, pois seu barco é atacado por tubarões que devoram o
peixe por completo. Creio que o mais importante seja que, embora tenha perdido o peixe para os tubarões, nada pode tirar de Santiago a sua luta: o sofrimento que só ele conheceu, a forma como executou com maestria seu ofício de pescador, resultando, afinal, na captura do peixe. Ou seja, ainda que o resultado não tenha sido o melhor possível, o que fica é o processo, a trajetória. Faço aqui uma comparação com a psicoterapia: para a pessoa que está em atendimento, também é muito mais importante o processo do que os resultados.
No entanto, assim como ocorre em toda falha, a experiência é o que de mais valoroso podemos levar conosco. Somente Santiago vivenciou sua vitória e sua frustração, e por isso, depois deste ocorrido, conhece melhor seus limites. Também na psicoterapia, o que se tem é uma prática do aprendizado, no sentido de que a pessoa em terapia vai cada vez mais se tornando consciente de seus limites, conseguindo determinar melhor suas fronteiras e expandindo seu auto-conhecimento em relação a suas limitações. É um aprendizado para a vida e, talvez por isso, seja comum ver referências à psicoterapia como um investimento em si mesmo.
No entanto, assim como ocorre em toda falha, a experiência é o que de mais valoroso podemos levar conosco. Somente Santiago vivenciou sua vitória e sua frustração, e por isso, depois deste ocorrido, conhece melhor seus limites. Também na psicoterapia, o que se tem é uma prática do aprendizado, no sentido de que a pessoa em terapia vai cada vez mais se tornando consciente de seus limites, conseguindo determinar melhor suas fronteiras e expandindo seu auto-conhecimento em relação a suas limitações. É um aprendizado para a vida e, talvez por isso, seja comum ver referências à psicoterapia como um investimento em si mesmo.
Um outro ponto importante é o papel desempenhado pelo garoto Manolim. Quando o velho retorna do mar, absolutamente esgotado e desacreditado, Manolim, na minha opinião, funciona como self, mantendo seu eixo organizado. É razoável supor que, caso Manolim não estivesse ali, o destino final do velho poderia ter sido diferente.
Enfim, era essa a reflexão que eu queria trazer sobre a existência humana. Sobre frustração e sobre solidão. Sobre a frase "seus esforços serão recompensados" nem sempre ser verdadeira. Sobre levar-se ao extremo e, mesmo assim, às vezes não chegar aos resultados pretendidos.
Mas o que fica é a beleza do peixe.
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