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A Terapia Assistida por Animais e suas Possibilidades



Você já ouviu falar em terapia com animais? Em caso positivo, provavelmente tem uma boa compreensão dos benefícios que a participação de animais treinados tem sobre a saúde mental e interação psicossocial humana.

Se você nunca ouviu falar sobre o assunto, talvez esteja se perguntando: como é possível que os animais promovam benefícios à saúde? Quais os mecanismos envolvidos? Como deve acontecer a interação com o animal? Ou talvez só esteja com uma curiosidade instigante. Talvez até esteja contente pelo vislumbre do fato que a interação com animais promova saúde.

Eu particularmente me interesso muito pelo assunto. Pois amo animais e o meu trabalho de psicólogo. A realidade de conjugar os dois elementos para oferecer o melhor possível para meus clientes é fortemente gratificante. É uma forma clínica com diversas possibilidades que estabelece condições para o crescimento de clientes, não passíveis de alcançar por outros meios.

Mas como fazer essa inserção do animal na clínica?

Existe mais de um método para se trabalhar com animais como co-terapeutas. Irei enumerar os que são possíveis de se encontrar na literatura científica e existem estudos sobre [1][2]:

1. Terapia Assistida por Animais (TAA);
2. Atividade Assistida por Animais (AAA);
3. Intervenção Assistida por Animais (IAA);
4. Terapia Lúdica Assistida por Animais (TLAA).

Cada um desses métodos varia de acordo com o propósito ou objetivo da inserção do animal no campo terapêutico. Para cada um deles existem técnicas diferenciadas, devidamente aplicadas em coerência com as finalidades terapêuticas [2].

Os animais mais frequentemente utilizados são caninos, equinos, felinos, aves, coelhos, e em alguns casos mais curiosos e isolados, golfinhos, patos, cabras e até lhamas! Tomei conhecimento de uma equipe que utilizou até mesmo uma rena na época do Natal, como assistente em uma Atividade Assistida por Animais. Veja a seguir:



E como esses métodos acontecem na prática?

É imprescindível que antes de iniciar a discussão sobre a prática, sejam expostos os fundamentos científicos da participação dos animais em atividades terapêuticas. A simples interação com animais traz benefícios fisiológicos para a saúde: reduz a pressão arterial, os batimentos cardíacos e provoca relaxamento [3]. Além de ocorrerem benefícios psicossociais, por exemplo, maior abertura para interação social, expressão de sentimentos e disponibilidade para elaboração de conflitos interiores [4].

Existem até mesmo relatos mostrando que o simples fato de se ter um animal de estimação, promove a saúde de seus tutores [5][6]. Em um estudo, foram coletados dados mostrando a maior tendência a longevidade de idosos que tinham animais de estimação [6].

A partir da constatação dos benefícios advindos dos relatos de diversas experiências e estudos realizados sobre a interação humana com animais, podemos então, escolher e personalizar a metodologia mais adequada.

De maneira geral os quatro métodos citados (TAA, AAA, IAA e TLAA), compartilham de algumas essências.

a. Todos mostram que a participação do animal será benéfica;
b. Todos contam com a participação de animais que apresentam o perfil para as atividades e que foram devidamente treinados;
c. O objetivo é o animal interagir de alguma forma com o cliente/paciente.


Entretanto apresentam especificidades!

A Atividade Assistida por Animais é um evento isolado em uma rotina preestabelecida, que utiliza da assistência dos animais para promover de forma pontual a saúde dos participantes. Por exemplo, visitação de animais em hospitais, clínicas, empresas, ou outros ambientes que apresentem diversos fatores estressantes. É importante ressaltar que as visitas sempre devem ser coordenadas por um profissional parceiro do animal-terapeuta, para oferecer apoio e suporte para a elaboração da experiência ocorrendo no momento da interação com o animal. Dessa forma, a intervenção sobre a saúde é potencializada. O mais indicado é que seja um(a) Psicólogo(a) na coordenação da atividade. [7].

A Intervenção Assistida por Animais conta com a participação animal para processos de reabilitação, reeducação e promoção de saúde, conjuntamente ou não. Não necessariamente necessita de um acompanhamento profissional, pois não constitui uma intervenção em que as pessoas que usufruem da interação, apresentam necessariamente problemas de saúde ou risco de adoecimento. No entanto, o público alvo necessita de apoio psicossocial. Por exemplo, nos Estados Unidos, existem programas que utilizam animais de abrigo para auxiliar na reabilitação e reeducação de encarcerados, como o Jail Dogs Program. Veja o vídeo abaixo sobre o programa:


Existe também outro exemplo, em que veteranos de guerra ganham animais de estimação que oferecem apoio aos soldados que retornam para casa, também nos Estados Unidos.

Os dois métodos que ainda não foram discutidos aqui, são métodos terapêuticos processuais. Na Terapia Lúdica Assistida por Animais, a inserção do animal terapeuta se dá durante o brincar terapêutico. Os animais treinados para esta atividade dão assistência para promover e ampliar o relacionamento social das pessoas. A comunicação não-verbal dos animais, auxilia as pessoas a se relacionar possibilitando que novos repertórios de habilidades sociais emerjam. [1]

A Terapia Assistida por animais, também como um método processual, auxilia da mesma forma de a Terapia Lúdica, entretanto agrega distintas formas de promover a saúde psicossocial. A competência de comunicação não-verbal do animal, oferece apoio semelhante. Por este fato, as resistências das pessoas são atenuadas, e repercute em maior abertura para se relacionar. Tal abertura aumenta as possibilidades de interação com o ambiente e com as pessoas. Dessa forma, a Terapia assistida por animais enquanto método utilizado por psicólogos é um apoio para diminuir ansiedade, estresse e resistência, pois proporciona crescimento a nível psicossocial, que diz respeito a integração entre aspectos psicológicos e sociais, necessários para estabelecer relacionamentos e auto-suporte para saúde mental. [4][8][9].

Antes de finalizar, é importante ressaltar alguns pontos. Para realizar tais serviços, é imprescindível considerar a saúde e bem-estar do animal que vai assistir a atividade. Como também avaliar a voluntariedade do animal para se relacionar com humanos, além de treinar os comportamentos do animal. A organização estadunidense PetPartners.org, oferece em seu site um guia para avaliação de animais terapeutas. É necessário acompanhamento periódico do médico veterinário, para se certificar da saúde do animal.


No Brasil, o campo de profissionais que utilizam animais terapeutas ainda é bem restrito, com um maior movimento em São Paulo, a exemplo do Instituto Nacional de Ações e Terapias Assistidas por Animais (INATAA). Entretanto, O campo brasileiro apresenta grande potencial, pois os profissionais estão mais perceptivos às fortes evidências dos benefícios dessas intervenções.

Uma experiência pessoal que corrobora com tal afirmação, é quando converso sobre a minha cã-terapeuta com as pessoas, a maioria desconhece as possibilidades da terapia assistida por animais, e desconhecem profissionais que também realizam tais atividades. Entretanto, todos expressem curiosidade e entusiasmo com a possibilidade das intervenções terapêuticas com animais.

Enfim, dentro da psicoterapia é possível a aplicação de TAA ou AAA. Evidentemente devem ser aplicadas com consciência reflexiva do profissional.

Até mesmo o grande pioneiro da psicologia enquanto clínica, Sigmund Freud, apreciava as contribuições que seu cão, um Chow Chow chamado Jo-Fi, fazia para as suas sessões psicanalíticas. Freud o levava para seu consultório em algumas oportunidades, e percebeu os benefícios que a presença do seu cão trazia para as verbalizações e, portanto, elaborações de seus clientes. Especialmente de crianças e adolescentes [4].

Porque não, então, explorar e aplicar tal método, com responsabilidade e ética dentro das nossas possibilidades de atuação?



REFERÊNCIAS:

1. INTERNATIONAL INSTITUTE FOR ANIMAL ASSISTED PLAY THERAPY. Certification Program, 2015. www.internationalinstituteforaapt.org

2. FINE, A. H. Handbook on Animal-Assisted Therapy: Theoretical Foundations and Guidelines for Practice. Elsevier Inc. 2010.

3. SOUTER M.A; MILLER M.D. Do animal-assisted activities effectively treat depression: a meta-analysis. Anthrozoos; 20(2): pp. 167-180, 2007.

4. EGGIMAN, J. Cognitive-Behavioral Therapy: A Case Report: Animal-Assisted Therapy. MedScape.com. 2006.

5. BECKER, M; MORTON, D. The Healing Power of Pets. Hyperion Books, 2003.


7. Atividade Assistida por Animais: Como os Cães Melhoram a Vida dos Idosos. http://portalmelhoresamigos.com.br/atividade-assistida-por-animais-como-os-caes-melhoram-a-vida-dos-idosos/

8. SCHAEFER, K. Human-animal interactions as a therapeutic intervention Counseling and Human Development, 34(5) pp.1-18, 2002.

9. STERN, C; KONNO, R. The effects of Canine-Assisted Interventions (CAIs) on the health and social care of older people residing in long term care: a systematic review. JBI Library of Systematic Reviews, [S.l.], Vol. 9, N. 6, pp. 146 - 206, 2011.

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